BRASIL - Nova modalidade do Pix oferece mais facilidade de pagamento, mas pode levar ao endividamento, alerta especialista
O Pix se popularizou no Brasil: no primeiro trimestre deste ano, o número de transações via sistema de pagamentos instantâneos atingiu 3,89 bilhões, alta de 34% em relação ao mesmo período de 2021.
Devido ao uso amplo da ferramenta, as instituições financeiras estão criando novas soluções com o Pix. Uma que vem ganhando destaque é o chamado Pix Parcelado.
Sobre o assunto, o InfoMoney compilou informações de especialistas e grandes bancos. Confira:
O que é o Pix Parcelado?
O Pix Parcelado é um formato de crédito pessoal que dá a possibilidade ao consumidor de fazer um pagamento à vista com Pix podendo parcelar a compra em várias vezes.
“O cliente precisa ter em mente que, nesse tipo de transação, está firmando uma relação com a instituição financeira. Ele faz um Pix ao vendedor, que recebe o valor na hora, mas ele poderá pagar em várias parcelas com juros ao banco”, diz Marcelo Martins, diretor da ABFintechs.
“Não é um serviço gratuito — embora o Pix seja; e a relação de crédito existe entre a instituição e o cliente, sendo o Pix apenas uma ferramenta de marketing”, completa Martins.
Veja um exemplo: você busca um
crédito (ou empréstimo) pessoal em banco ou financeira. A liberação do dinheiro, o montante e as condições de pagamento dependem da análise de sua renda, de seu histórico de crédito e de seu relacionamento com a instituição. No caso dos bancos, o tomador normalmente precisa ser correntista.
Com o Pix Parcelado, a lógica é a mesma, com a diferença que a instituição financeira faz o pagamento para o vendedor ou lojista via Pix e depois mantém o relacionamento com você, cliente, que vai pagar mensalmente as parcelas com juros.
Os clientes têm a possibilidade de parcelar valores em 12, 24 ou até 60 vezes — em alguns casos, os juros mensais variam conforme o perfil do contratante.
Cada instituição tem sua regra: os valores são parcelados via cartão de crédito, mas há casos em que são debitados diretamente na conta do correntista.
O “pulo do gato” do Pix Parcelado é permitir ao consumidor, sem saldo suficiente em conta, efetuar um pagamento ou transferência. E mais: contrair crédito, caso queira.
Pix Parcelado está no escopo do Pix do Banco Central?
A resposta é Não.
Marcos Zanini, CEO da empresa de segurança digital Dynamo Networks, explica que o Pix Parcelado não é uma ferramenta oficial regulamentada pelo Banco Central, “mas que pode ser adotada pelos bancos e fintechs, como já ocorreu com o Santander, Mercado Pago e Pic Pay”.
“Essa foi uma ideia das instituições para relacionar o Pix ao crédito, mas não tem relação com a agenda de inovação do Banco Central em relação ao Pix. São coisas diferentes. Os bancos e fintechs viram uma oportunidade de negócio e estão comercializando seus produtos.”, acrescenta Martins.
Esse ambiente de livre mercado e de novos produtos e serviços é incentivado pelo BC, que criou o sistema Pix a fim agilizar as transações, oferecendo uma opção simples, segura e mais prática aos brasileiros.
O BC, no entanto, estrutura em breve o lançamento de um produto semelhante ao Pix Parcelado, cujo nome será Pix Garantido.
“O produto Pix Garantido, que permite o parcelamento de transações no Pix, ainda não foi lançado pelo BC e não há previsão de lançamento. Nada impede que os bancos, desde já, ofertem crédito aos seus clientes para utilização em pagamentos via Pix. É um produto de cada banco”, afirmou, por nota, o BC.
A promessa é de que a ferramenta da autoridade monetária permita o parcelamento das compras sem qualquer relação com cartão físico, emissor ou bandeira, o que deve baratear a operação devido aos juros menores aos praticados, hoje, no formato do Pix Parcelado.
“A ideia é o cliente não ficar sujeito às taxas altas dos bancos e aplicativos. Mas será preciso esperar para ver”, explica Zanini. Martins acrescenta que vai ser criado um padrão de operação em que as instituições que quiserem oferecer o produto terão de seguir, o que inclui formato de cobrança e experiência do cliente.
Vale a pena usar o Pix Parcelado?
Melhor outra pergunta: o produto se encaixa na sua realidade, consumidor?
Este questionamento ensinado pelos especialistas serve para analisar qualquer ferramenta financeira.
O alerta é não confundir o Pix na operação de transferência tradicional, que é completamente gratuita, com a opção parcelada, que tem custos considerados altos.
“O consumidor não pode se iludir com a facilidade para tomar esse tipo de crédito. Por ser uma modalidade fácil e com menos burocracia, muitas pessoas podem cair em cilada”, afirma Juliana Inhasz, que leciona finanças e economia no Insper, em São Paulo.
“Apesar da facilidade do parcelamento, que está enraizado na vida financeira do brasileiro, os juros geralmente não compensam. O risco é o consumidor começar a usar o Pix Parcelado como se fosse o Pix normal e somar dívidas e dívidas que não precisariam ser feitas”, diz Allan Inácio, professor de finanças da PUC-PR.
Cada instituição tem liberdade para oferecer o produto como quiser — atrelado ao crédito pré-aprovado ou atrelado ao saldo do cartão, por exemplo — bem como embutir juros em diferentes etapas.
Por isso, a dica é: compare sempre os custos. “É preciso se atentar quanto às taxas para conferir se o parcelamento compensa. Dependendo do valor, é melhor optar pelo desconto que muitos comércios oferecem pelo pagamento à vista via Pix tradicional do que optar pelo parcelamento”, acrescenta Zanini.
Inhasz explica que o exercício que precisa ser feito é o de comparação.
“Se pergunte: há a necessidade de tomar um crédito desse tipo? Reflita sobre seu momento e o que você quer comprar com esse crédito. Além disso, quanto ele efetivamente vai te custar? Existem outras linhas no mercado mais baratas e com melhores condições”, orienta a especialista.
A especialista do Insper ainda lembra que o consumidor precisa ficar atento para não se endividar mais com as facilidades do Pix parcelado. “Em alguns casos em que a pessoa é negativada e não tem outra alternativa, por exemplo, talvez possa ser uma opção, considerando que os juros do cheque especial e do rotativo do cartão de crédito são muito maiores. Mesmo assim a palavra de ordem é comparar e tomar crédito de forma consciente”, afirma.
Diante do impulso e das facilidades do Pix Parcelado, Inácio ensina que a melhor solução, sempre, é pagar uma conta à vista. “Na vida financeira, sempre que possível, paggue à vista porque é o melhor negócio. Não ter dívida é o caminho mais saudável”.
Considere uma situação hipotética: você busca comprar um celular de R$ 1.000 e não consegue desconto. Mesmo assim, decide comprar o aparelho via Pix parcelado.
Se o juro, no caso hipotético, for de 4% por parcela — são 10 no total, o custo será de 10 x R$ 100, mais os juros: R$ 1.040. O valor não inclui os juros sobre o preço principal do produto cobrado.
Se o produto ou serviço não tiver desconto algum no pagamento à vista, ou o percentual de desconto for menor do que o juro do parcelamento via Pix não vale a pena usar o recurso, dizem os especialistas.
“Mas ninguém antecipa crédito sem cobrar algo por isso, assim, qualquer parcelamento tem custo. Por isso, o cartão de crédito pode valer a pena sempre considerando uma compra sem juros e que o consumidor pagará a fatura em dia — já que os juros do rotativo do cartão são muito maiores que os do crédito pessoal”, ressalta Inácio.
Por outro lado, se o percentual de desconto for maior do que os juros cobrados pela instituição financeira que oferecer o Pix Parcelado, tomar esse crédito pode ser opção. “A partir desta comparação, o cliente pode tomar a decisão, mas depende de cada caso, produto e valor”, pondera.
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Quem já oferece?
Bradesco, Digio (banco digital que pertence ao Bradesco), Santander, Mercado Pago, e Pic Pay já ofertam o Pix parcelado. Banco do Brasil, Caixa e Itaú avaliam a possibilidade do serviço, mas ainda não oferecem.
O C6 Bank não tem Pix Parcelado e não tem previsão de oferecer. Inter e Nubank não responderam às solicitações da reportagem.
Como funciona e quais as taxas nas instituições?
Bradesco
A modalidade é chamada de Crédito Pix, e foi lançada em janeiro de 2021. No próprio app do banco, o consumidor pode aderir ao parcelamento Pix, na área de transferências do sistema de pagamentos instantâneos, a partir de condições de crédito pré-aprovadas pelo banco.
“O banco avalia em tempo real a melhor opção de crédito aos clientes com juros a partir de 2,36% ao mês e prazo de até 60 vezes para pagar, conforme o perfil do cliente e característica da operação”, disse por nota. Também oferece simulação para ajudar o cliente.
O tíquete médio do recurso no banco é de R$ 200. E é uma linha com demanda crescente. Desde que a opção foi lançada, 850 mil clientes foram atendidos, o que corresponde a R$ 170 milhões em operações.Digio
O cliente pode usar o Pix parcelado por meio do limite disponível no cartão do banco. “Realizando o parcelamento do Pix, o beneficiário da transação recebe o valor integral na hora e você, que está realizando a transferência, paga de forma parcelada por meio do seu DigioCartão”, diz o banco em seu site.
O valor mínimo para usar o serviço é de R$ 50 e o máximo é de R$ 3.000, podendo variar conforme o limite do cartão. O valor pode ser parcelado em até 12x e não pode ser maior que 40% do limite disponível no cartão de crédito do cliente.
Cerca de 60% das transações parceladas do Pix no banco são valores de até R$ 200. “Esta opção será exibida no DigioApp apenas se houver limite disponível no seu cartão de crédito. Caso contrário, aparecerá como indisponível”, explica o banco em seu site.
Para dividir um Pix, o cliente do banco deve acessar a área Pix e selecionar a opção “Parcelar no DigioCartão” após informar a chave Pix. Deve ver as opções e valores de parcelas disponíveis e escolher uma delas e depois colocar a senha do cartão para efetuar a operação.
O banco não divulgou as taxas mensais cobradas para a operação.Mercado Pago
O Mercado Pago, fintech do Mercado Livre, também oferece a opção atrelada ao formato de crédito pessoal que a plataforma já oferece.
“Podem aderir ao Pix Parcelado usuários que já têm uma linha de empréstimo pessoal aprovada no Mercado Crédito. O pedido de parcelamento do Pix só será recusado se o cliente não tiver uma linha de empréstimo já aprovada no Mercado Crédito ou se o valor solicitado estiver acima do que ele tem pré-aprovado”, explica a empresa em nota.
O recurso pode ser usado para o pagamento de qualquer QR Code.
A empresa ressalta que atende também clientes negativados em outras instituições. “A análise de crédito considera o histórico do cliente na plataforma e o uso dos produtos Mercado Livre ou Mercado Pago, e outras variáveis utilizadas na concessão de crédito”, diz a empresa.
Os juros cobrados na operação partem de 2,5% ao mês em cada parcela, de acordo com o histórico do cliente, e o usuário pode fazer o parcelamento do Pix em até 12 vezes. O valor mínimo para parcelar o Pix é de R$15 e o máximo depende do limite de empréstimo pessoal que o usuário já tem aprovado.
O Pix parcelado está disponível no Mercado Pago desde meados de fevereiro. O parcelamento do Pix vale para pagamento de QR Pix gerado em qualquer instituição financeira. Quando o usuário faz a compra, a opção de parcelamento do Pix já aparece automaticamente entre as que ele tem disponível para pagar.
“O usuário tem a opção, quando contrata o parcelamento, de escolher a melhor forma de quitar os valores: dinheiro em conta, Pix ou boleto. Basta entrar na área Mercado Crédito dentro da conta para fazer o pagamento”, explica a empresa. Em todos os casos, há incidência de juros.Pic Pay
No Pic Pay, o parcelamento do Pix é atrelado ao cartão de crédito da empresa.
“Seu limite do cartão de crédito vira saldo em sua carteira PicPay e, a partir disso, você consegue fazer o Pix parcelado”, explica a empresa em seu site.
Para fazer o Pix Parcelado via Pic Pay, o cliente precisa, na área Pix, escolher seu cartão de crédito como forma de pagamento e adicionar saldo à carteira digital do Pic Pay para fazer seu Pix na hora e parcelar.
No entanto, a adição de saldo em carteira com cartão ou parcelamento possuem taxas extras. É possível parcelar em até 12 vezes, mas a empresa não informa valor mínimo para a operação.Para pagamentos com cartão, a taxa de conveniência é de 3,99% do valor total
Para pagamentos parcelados, a taxa de conveniência adicional é de 3,99% por parcela
O Pix Parcelado é cobrado pelo valor do produto, com juros por uso do cartão sobre o valor principal, e juros por parcelar por dividir a compra.
No app, o cliente deve entrar na área Pix, selecionar a opção de Pix com cartão, digitar o valor, desabilitar o saldo como forma de pagamento e selecionar ou adicionar um cartão. Depois é só concluir a operação.Santander
No Santander, o Pix Parcelado tem valor mínimo de contratação de R$ 100; o valor máximo é limitado às condições de crédito pré-aprovadas para o cliente, que pode parcelar em até 24 vezes, com 59 dias para que as parcelas comecem a ser debitadas diretamente na conta corrente.
As taxas partem de 1,59% ao mês. Segundo o banco, o serviço é destinado para clientes pessoas físicas do Santander, e a transferência pode ser direcionada para contas pessoas físicas e pessoas jurídicas.
“Ao escolher a opção Pix e selecionar pagamento ou transferência, a inteligência digital do aplicativo Santander mapeia as oportunidades de crédito do cliente, considera variáveis que definirão as condições de cada operação e a oferta aparecerá na tela do smartphone. Também será possível alterar o prazo de pagamento e ativar o seguro prestamista. O solicitante poderá visualizar os comprovantes do Pix e do Crédito Parcelado também no app do Banco.”, explica o banco em nota.
Pix Parcelado x cartão de crédito
O Pix Parcelado ganha tração diante da popularidade e da adoção do Pix em larga escala, mas também por ser uma alternativa ao cartão de crédito, sobretudo, quando o volume de transações ultrapassa o de cartões no país.
Mas nada impede que as instituições criem novos serviços para manter as receitas do segmento.
Fonte: Infomoney
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