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UFRJ anuncia medidas para atrair mais de 12 mil estudantes que deixaram a sala de aula

Adryelson Batista Silva, 23 anos, é de uma cidade do interior do Pará e veio morar no Rio de Janeiro —
Foto: Guito Moreto / Agência O Globo
RIO
- Desde pequeno, Mateus Pereira, de 19 anos, sonhava em ser professor. Sem ter referências familiares com curso superior, ele fez o Exame Nacional do Ensino Médio (Enem), em 2021, e conseguiu uma vaga no curso de licenciatura em Educação Física, na Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Morador de Magé, na Baixada Fluminense, Mateus decidiu se mudar para uma república na Cidade Universitária, no Fundão, para conseguir assistir às aulas. Mas o gasto mensal de mil reais por mês e o risco de sua mãe perder o trabalho como empregada doméstica o levaram a desistir do curso.

— Quis me prevenir de uma situação que poderia ser pior. Se eu tivesse um suporte na faculdade para arcar com os custos de morar mais perto, seria diferente. Naquela época, fiquei sem saída porque estava na incerteza se conseguiria ou não os auxílios dados pela universidade, ou uma vaga no alojamento, então fiz o que era mais certo — lamentou.

A história de Mateus é apenas uma das muitas contadas nos corredores da universidade. Não é raro ouvir que alunos abandonaram ou trancaram a matrícula devido a dificuldades financeiras. Do início da pandemia até o fim do ano passado, 12.754 estudantes deixaram a UFRJ. Desses, mais de 5 mil tinham entrado por meio de programas de ações afirmativas, ou seja, cotas sociais. O novo reitor da UFRJ, o epidemiologista Roberto Medronho, ainda observa que a evasão na instituição cresceu após a Covid-19. Para tentar resgatar esses alunos, a gestão atual fará uma busca ativa.

— O aluno das ações afirmativas possui uma vontade muito grande de se formar, porque o diploma mudará a vida da família dele e da comunidade ao redor. Se esse aluno desistiu, é porque existiu uma barreira muito grande — diz Medronho.

Foco nos cotistas
Segundo o reitor, o período pandêmico e suas consequências, que incluem desemprego e dificuldades financeiras, impactaram nesses números, e mais intensamente os cotistas. Por isso, nesse primeiro momento, o processo de busca ativa será direcionado a eles:

— Estamos levantando os dados desses alunos para convocá-los a voltarem para a faculdade. A ideia é entender qual foi a motivação para desistir do curso, se foi algo na vida pessoal ou se a razão foi vulnerabilidade social e econômica. O nosso objetivo é criar recursos para que eles continuem na UFRJ, já que eles já fizeram o mais difícil, que é entrar.

Na pandemia, quando as aulas eram on-line, a universidade publicou uma resolução que impedia a reprovação por faltas, para evitar o cancelamento de matrículas. No segundo semestre do ano passado, as atividades presenciais foram retomadas, o que fez explodir a evasão. Se, no primeiro semestre, 487 alunos deixaram a universidade, no seguinte foram 3.360. O reitor afirma que esses números ainda precisam ser analisados porque é necessário observar o acumulado dos meses em que o cancelamento não foi possível. Entretanto, mesmo levando esses pontos em consideração, o crescimento da evasão foi considerado acima do “normal”.

A UFRJ terá duas linhas principais de atuação para resgatar e manter os alunos que deixaram de estudar. A primeira é solicitar um aporte suplementar de recursos ao governo federal para disponibilizar mais bolsas. Além disso, Medronho conta que planeja criar mais oportunidades para que esses estudantes consigam estágios na iniciativa privada.


Um estudante de Astronomia, de 21 anos, que não quis se identificar, está na corda bamba, prestes a abandonar a faculdade. Morador de Volta Redonda, no interior do estado, ele entrou para o curso por cota de raça e escola pública. Está com a matrícula trancada desde julho do ano passado por não ter condições financeiras de continuar na sala de aula. Para se mudar, colocou as roupas num saco de lixo e pegou uma carona até o Rio. Na universidade, comia, tomava até banho e pegava água para beber, mas não foi suficiente:

— O problema não é só o dinheiro ou estrutura, é falta de informação para quem vem de longe, não só geograficamente, como na classe social, na cor da pele, no gênero, na cultura. A universidade poderia nos acolher melhor, deixando claro quais são os nossos direitos e mostrar as oportunidades que existem.

Atualmente, a UFRJ tem oito tipos de auxílio para estudantes, além das bolsas de monitoria, extensão e pesquisa. Entre outros, os de moradia (R$ 960) e de permanência, de R$ 700. De acordo com a instituição, só essas duas bolsas, que são de maior valor, atendem 2.673 estudantes.

Entretanto, alunos revelaram que esperam meses para receber o pagamento do benefício. Sem ajuda, alguns fazem jornada dupla no trabalho, enfrentam reprovações e dívidas no cartão de crédito para pagar a passagem e material. Mateus da Silva, de 27 anos, por exemplo, saiu de Jundiaí (SP), para estudar Arquitetura e Urbanismo na UFRJ. Ele conseguiu uma vaga no alojamento da faculdade e recebe auxílio permanência. No primeiro período do curso, porém, precisou vender o liquidificador e o ventilador para comprar parte do material exigido nas aulas. Ao EXTRA, Medronho disse que a UFRJ trabalha para pagar o benefício no primeiro mês.

Persistência
Adryelson Batista Silva, de 23 anos, percorreu uma longa trajetória para sair de Prainha, no interior do Pará, e chegar até a UFRJ, em 2021. Mas só conseguiu a primeira parcela do auxílio em meados de 2022. Ele recebe R$ 1.260 e, só pelo quarto que aluga no Andaraí, na Zona Norte do Rio, gasta R$ 900. Sobram R$ 360 para alimentação, material e transporte. Adryelson diz que nem sempre tem o que comer no fim de semana:

— No interior, as pessoas sempre falavam que o que vem fácil também vai embora rápido. E o que vem difícil, é mais sólido. Lembrar disso me motiva. Se está sendo difícil agora, é porque lá na frente terei sucesso. Não vou desistir.

Fonte: EXTRA

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